O Brasil deve engrossar em breve a lista de países com uma regulação específica para o mercado de carbono – o que representa um avanço significativo, mas que, sem uma proposta bem calibrada, pode ser insuficiente para a urgência demandada pela crise climática. Depois de aprovado na Câmara dos Deputados em dezembro, o projeto de lei que visa chancelar a iniciativa volta a ser discutido no Senado.
Assim, um processo que começou bem antes pode se concretizar para o país. Há pelo menos três décadas, a busca por soluções capazes de mitigar os efeitos das ações humanas no clima estourou a bolha da comunidade científica, envolvendo governos, empresas e a sociedade civil.
Um dos principais objetivos é limitar a temperatura global a até 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. Para isso, é necessário estabilizar as concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera, e o mercado de carbono é parte desse esforço conjunto.
Os 195 países signatários são os principais responsáveis por relatar suas emissões e organizar esforços (inclusive mobilizando as empresas) para reduzi-las, conforme suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, em inglês) – como são chamadas as metas fixadas por cada economia. Na última atualização das NDCs, em 2023, o Brasil se comprometeu a cortar as emissões em 48% até 2025 e em 53% até 2030
Desde Rio, Kyoto e Paris, nunca saiu de fato do papel a ambição em criar o mercado de carbono regulado em nível mundial – hoje uma das maiores apostas para que as metas de descarbonização global sejam atingidas e que visa incentivar a economia verde. O que o Brasil discute atualmente no Congresso é, justamente, como fazer isso em âmbito nacional.
O passo mais recente em direção à regulação do mercado de carbono no país foi a aprovação, em dezembro pela Câmara dos Deputados. O texto final modificou uma proposta que já havia sido aprovada pelo Senado após debates ao longo de meses, além de juntar ao projeto outros PLs que vinham sendo discutidos nos últimos 15 anos.
A partir da aprovação do PL pelo Congresso, o país terá limites legais de carbono emitido pelas empresas.
Se o texto seguir conforme a versão votada pela Câmara, a expectativa é que o mercado regulado brasileiro inclua todas as atividades econômicas que emitem acima de 10 mil toneladas de dióxido de carbono por ano, com exceção do setor agropecuário – prerrogativa que foi alvo de intensas negociações e ainda está envolta em polêmicas. Na prática, os setores cobertos são definidos por regulamentação própria, após a edição da lei.
Também de acordo com a proposta, fontes de emissão que ultrapassarem o teto legal de 25 mil toneladas estarão sujeitas aos limites de emissão a serem definidos para cada setor. Assim, deverão apresentar permissões – denominadas Cotas Brasileiras de Emissões (CBE) na atual versão do PL – em montante suficiente às emissões realizadas.
Outra possibilidade prevista no PL é que esses agentes compensem as emissões excedentes com a aquisição de permissões adicionais de empresas que tenham emitido abaixo dos limites a elas impostos.
Alternativamente, também podem negociar créditos de carbono e títulos de projetos de redução de emissão – que incluem ações de reflorestamento, uso de energia renovável e captura de gases, como o metano (que promove mais aquecimento do que o carbono).
Essa seria uma via de entrada dos créditos de carbono oriundos do mercado voluntário para o regulado, o que também seria melhor definido posteriormente, no âmbito regulatório.
O Registro Central do SBCE será a plataforma de operacionalização do mercado e é a ele que as companhias deverão apresentar os seus dados de monitoramento de gases de efeito estufa. Para tanto, o SBCE contará com um órgão gestor.
Caso as normas sejam desrespeitadas, a multa imposta parte de 3% do faturamento bruto da empresa e pode chegar até 4%, em caso de reincidência. A implementação será feita em fases, sem sanções iniciais nos primeiros cinco anos para a calibragem das informações feitas ao órgão regulador.